Desvendando o Mercado de Carbono: estratégias e potenciais para reduzir os impactos das mudanças climáticas
No Brasil, especialmente com a iminente sanção presidencial ao aguardado Projeto de Lei nº 412/2022, de relatoria da senadora Leila Barros (PDT-DF), o atual momento do mercado de carbono evidencia um período de profunda transformação. O PL tem o objetivo de estabelecer um limite para as emissões de dióxido de carbono (CO2) lançados na atmosfera pelas empresas e, ao obter a aprovação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), o país se projeta à vanguarda da regulamentação ambiental, procurando não apenas mitigar as emissões, mas também encontrar oportunidades econômicas substanciais.
A exclusão do agronegócio, embora sensível, revela a complexidade inerente à abordagem das emissões em setores diversos. O mercado de carbono emerge como uma ferramenta de alto potencial, que, quando empregado de maneira responsável e transparente, pode desempenhar um papel importante na construção de um futuro mais sustentável e resiliente. Este novo cenário não só consolida o compromisso ambiental do País, mas também traça um horizonte em que desenvolvimento econômico e preservação ambiental se torna não apenas viável, mas sobretudo imperativa.
Porém, para entender a discussão em torno do tema, é preciso primeiro saber o que é e qual o objetivo do mercado de carbono. Definido como um mecanismo que procura compensar as emissões de gases de efeito estufa (GEE), ele estabelece um sistema em torno da compra e venda de créditos de carbono, sendo que um crédito equivale a uma tonelada de gás. As empresas que conseguirem reduzir emissões abaixo do valor permitido, poderão vender os créditos excedentes para organizações ou governos que necessitam atingir metas de redução de GEE.
Participar deste processo requer, inicialmente, o cálculo da pegada de carbono. A partir desse estágio, estratégias são traçadas, resultando em créditos para comercialização. Para exemplificar, imagine uma empresa que apurou seu inventário de lançamento de gases de efeito estufa e estabeleceu, a partir daí, quais são as metas de redução. O ideal é que, primeiramente, foque em como aprimorar processos e tecnologias para atingir tal objetivo. Se não for suficiente, ela pode optar pela compra de créditos de carbono em valor equivalente às emissões para atender a meta.
As iniciativas para reduzir ou capturar podem vir por meio de projetos de energias renováveis, eficiência energética, reflorestamento ou até processos mais avançados de captura de carbono do próprio ar. Contudo, um ponto importante para observar e dar segurança para essas operações é que projetos geradores de créditos devem passar por um processo de diligência robusta de verificação, algo como um carimbo ou um certificado de qualidade dado por entidades independentes e reconhecidas pelo mercado, garantindo assim a veracidade da mensuração dos gases.
A transação de compra e venda se dará por meio de um processo similar a compra e venda de uma commodity no mercado financeiro. E é claro, como qualquer ativo financeiro, a relação oferta e demanda afeta o preço do crédito de carbono. O que já acontece na prática é que algumas empresas estão se antecipando e atuando de forma voluntária. Nesse caso, a empresa, pessoa ou governo faz a compensação espontaneamente, adquirindo créditos e direcionando recursos financeiros para o tema, incentivando e fomentando, em contrapartida, projetos com impacto positivo. Já no mercado regulado, em que a PL atuará, as empresas são obrigadas a adquirir os créditos se ultrapassarem alguns valores de emissões definidos pelo regulador.
O mercado de carbono no Brasil, portanto, está passando por transformações significativas impulsionadas pelo avanço do PL em questão. Aprovado pelo Senado Federal em outubro deste ano, representa um marco na jornada do país em direção a práticas mais sustentáveis. Mesmo com o agronegócio excluído da proposta, o senado aprovou a matéria após acordo com a Frente Parlamentar da Agropecuária, que introduziu emendas ao texto que estabeleceram que a produção agropecuária não será regulada pelo SBCE e que as emissões indiretas provenientes da produção de insumos do setor estão fora do escopo de regulamentação devido à falta de parâmetros técnicos confiáveis para dimensioná-las. Para cumprir a legislação, ou as companhias reduzem os lançamentos ou adquirem créditos de carbono. É um novo mercado, com alto potencial, que está se apresentando.
Por Marcelo Sarkis é Superintendente de Riscos (Crédito, Mercado, Liquidez, Socioambiental, Integrado e Capital) do Banco BV.