Vacinação, pode ou não ser obrigatória?

Por José Coelho

Estamos vivendo um período totalmente adverso, onde todos estão “reclusos” em suas casas ou privados de suas rotinas habituais, em virtude da pandemia da COVID-19.

Todavia, está surgindo uma luz ao final do túnel, que é a vacina de combate ao COVID-19.

Com a chegada dos lotes de vacinas aos Estados e Municípios e diante da realidade de uma vacinação que já está sendo realizada na população, voltou a discussão um assunto polêmico: a vacinação pode ou não ser obrigatória?

Para tanto, inicialmente precisamos falar sobre o Princípio da Legalidade.

O Princípio da Legalidade está previsto na Constituição de 1988 e está descrito no inciso II, do artigo 5º.

A referida norma Constitucional tem o objetivo de assegurar uma vida digna, livre e igualitária a todos os cidadãos do país.

O artigo 5º, em seu inciso segundo, preconiza que:

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

Conforme mencionado em linhas volvidas, esse inciso trata do princípio da legalidade, que é uma das bases de um Estado Democrático de Direito, ou seja,um Estado regido por leis.

Segundo esse princípio, as pessoas podem fazer tudo aquilo que a lei não as impede e o Estado pode fazer apenas aquilo que a lei o permite.

Parece complicado, não é mesmo?

O princípio da legalidade é uma das bases da nossa Constituição, pois protege o cidadão de ações abusivas do Estado.

Isso porque, o princípio garante o respeito à lei.

O cidadão é livre se agir conforme a legislação e o Estado pode apenas adotar condutas previstas em lei.

Vamos entender como esse conceito tão importante se aplica na prática?

Quando se fala em legalidade, a primeira coisa que precisamos ter em mente é a existência de um conjunto de normas que devem ser respeitadas.

Em uma sociedade, as leis vão reprovar ou estimular determinadas condutas e serão aplicadas por uma autoridade competente.

De acordo com a legalidade, a conduta de uma pessoa pode estar de acordo com as leis e ser considerada legal, ou estar em desacordo com as leis e ser considerada ilegal.

Assim, o princípio da legalidade garante que somente as leis podem criar obrigações às pessoas, ou seja, o Estado só pode exigir que você faça ou deixe de fazer algo se essa exigência estiver escrita em uma lei.

Para resumir, a Constituição Federal é a Lei Maior do nosso país.

Mas o que poucos conhecem, com relação à vacinação, é que existe a Lei no 6.259, de 30 de outubro de 1975, que dispõe sobre a organização das ações de Vigilância Epidemiológica, sobre o Programa Nacional de Imunizações, estabelece normas relativas à notificação compulsória de doenças.

Dispõe o artigo 3º da Lei nº 6.259/75:

Art 3º Cabe ao Ministério da Saúde a elaboração do Programa Nacional de Imunizações, que definirá as vacinações, inclusive as de caráter obrigatório.

Parágrafo único. As vacinações obrigatórias serão praticadas de modo sistemático e gratuito pelos órgãos e entidades públicas, bem como pelas entidades privadas, subvencionadas pelos Governos Federal, Estaduais e Municipais, em todo o território nacional.

Já o artigo 7º da Lei nº 6.259/75, dispõe:

Art 7º São de notificação compulsória às autoridades sanitárias os casos suspeitos ou confirmados:

I – de doenças que podem implicar medidas de isolamento ou quarentena, de acordo com o Regulamento Sanitário Internacional.

II – de doenças constantes de relação elaborada pelo Ministério da Saúde, para cada Unidade da Federação, a ser atualizada periodicamente.

Portanto, a campanha de vacinação da COVID-19, se amolda perfeitamente ao descrito na norma acima indicada.

Em se tratando de tema de vacinação obrigatória, há alguns dispositivos que podem ser acionados dentro da legislação brasileira.

O mais recente é a lei 13.979 de 2020, proposta pelo presidente da república, Jair Bolsonaro, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada.

Isso quando o mundo começava a entender a dimensão do novo coronavírus e seus efeitos, ainda em fevereiro de 2020.

A lei prevê no seu artigo terceiro que para o enfrentamento da emergência de saúde pública, de importância internacional, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, a determinação de realização compulsória de vacinação.

O artigo terceiro, inciso 3, alínea D, fala explicitamente que para o combate à COVID-19 a vacinação poderá ser exigida compulsoriamente, ou seja, obrigatoriamente. Entretanto, é preciso observar que se trata, por enquanto, apenas de uma possibilidade.

O Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou no dia 17 de dezembro que governos locais possam estabelecer medidas para vacinação compulsória da população contra a covid-19, ou seja, união, estados, distrito federal e os municípios podem estabelecer medidas legais pela obrigatoriedade da imunização.

Isso não significa, porém, que o cidadão vai ser levado à força até uma unidade de saúde para se vacinar.  

O entendimento da corte se refere a restrição de direitos pela falta de comprovação da vacinação, como deixar de receber um benefício, ser proibido de entrar em algum lugar ou ser impedido de realizar matrícula escolar na rede pública de ensino.

Existe a obrigatoriedade, mas diferente do que algumas pessoas imaginam essa obrigatoriedade não é pegar a pessoa e fazer ela se vacinar a força.

O que ocorre é restringir a atuação dessa pessoa na sociedade como uma maneira de que ela tome a vacina.  

No mesmo julgamento, o STF decidiu que pais ou responsáveis de crianças e adolescentes também são obrigados a vacinar seus filhos.

Mesmo que existam leis sobre as vacinas, a Constituição Brasileira, de 1988, não fala explicitamente sobre os imunizantes. Só que, como era de se esperar de uma constituição, o texto fundamental aborda direitos dos cidadãos que devem ser protegidos pelo estado. É o caso do artigo sexto da constituição que estabelece a saúde como um direito social.

Já no artigo 196, há uma previsão que explicita que a saúde é direito de todos e dever do estado.

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Por lei, a vacinação também pode ser obrigatória, considerando essa previsão constitucional. O que acontece muitas vezes é que o direito de todas as pessoas à saúde pode colidir com outros direitos. Especialmente nesse caso, um dos argumentos que tem se levantado é a liberdade individual, da pessoa não querer se vacinar.

O direito coletivo à saúde se sobrepõe a vontade individual de se vacinar ou não, principalmente no contexto atual de pandemia, doença contagiosa e mais de 200 mil mortos no pais.  

O direito coletivo tende a sobressair aos direitos individuais, mas precisamos nos pautar pela Constituição e lidar com cuidado com o assunto para não gerar outros problemas.  

Vale destacar que o assunto ainda gera divergências até mesmo no judiciário.

Contexto de uma excepcionalidade mundial é que traz essa discussão e a resposta é que sim, essa excepcionalidade traz medidas mais drásticas, como tirar direitos de quem não se vacine, todavia, não levar uma pessoa em condução coercitiva para ser vacinada.

Agora, independentemente de legislação específica ou eventual intervenção do judiciário, cabe à nós cidadãos tem em mente que o “mundo” precisa se libertar dessa doença tão terrível, onde o começo dessa libertação está na vacinação, além das medidas de segurança já implantadas nos protocolos sanitários.

One thought on “Vacinação, pode ou não ser obrigatória?

  • Brilhante! O texto lembrou-me da Revolta da Vacina de 1904, quando a inoculação contra varíola tornou-se obrigatória e forçada, tendo como protagonista (ou antagonista) o sanitarista Oswaldo Cruz.
    Apenas para ampliar o colóquio, a discussão baseia-se entre dois princípios: a Vida e a Liberdade. José Afonso da Silva assevera que o direito à vida não deve se restringir à organicidade do corpo; por outro lado, John Stuart Mill (no Sobre a Liberdade) diz que se alguém quiser pular de uma ponte, que vá sozinho.
    Pois bem, sem vida (ainda que puramente orgânica) não há liberdade.
    Quem não quiser a vacina, que pule sozinho da ponte.

    Resposta

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